Em data de 2 de abril último escreve-nos nosso colega Sr. Delanne:
Caríssimo mestre, revi nossos irmãos de Barcelona. Lá, como na França, a doutrina se propaga, os adeptos são zelosos e fervorosos. Num grupo que visitei, vi dignos êmulos desse caro Sr. Dombre, de Marmande. Constatei a cura completa de uma senhora atingida por uma obsessão horrorosa, que datava de quinze anos, pelo menos, muito antes que tivesse ouvido falar de Espíritos. Médicos, padres, exorcistas, tudo havia sido empregado inutilmente. Hoje essa mãe de família voltou aos seus, que não cessam de dar graças a Deus por tão miraculosa cura. Dois meses bastaram para obter tal resultado, tanto pela evocação do obsessor quanto pela influência de preces coletivas e simpáticas.
Numa outra sessão foi feita a evocação do Espírito que obsidia, há dezoito anos, um manobreiro chamado Joseph, agora em vias de cura. Jamais fui tão penosamente emocionado quanto em presença das dores do paciente no momento da evocação. A princípio calmo, ele é tomado, de repente, de sobressaltos, de espasmos e de tremores nervosos; é tomado por um inimigo invisível, agita-se em convulsões terríveis; o peito se estufa, ele sufoca e depois, retomando a respiração, se torce como uma serpente, rola no chão, ergue-se de um salto e se bate na cabeça. Só pronunciava palavras entrecortadas, sobretudo: não! não! o médium, que é uma senhora, estava em prece. Toma da pena e eis que o invisível, deixando sua presa por um instante, apodera-se de sua mão e a teria maltratado, se o tivessem deixado.
Desde quinze dias evocam esse Espírito da pior espécie; nunca, porém, quis dizer o motivo de sua vingança. Premido por mim com perguntas, enfim confessou que esse Joseph lhe havia roubado aquela a quem ama. Nós lhe fizemos compreender que se quisesse não mais atormentá-lo e dar o menor sinal de arrependimento, Deus lhe permitiria revê-la. — Por ela, diz ele, farei tudo. — Então! dizei: Meu Deus, perdoai minhas faltas. — Depois de hesitar, ele nos disse: “Vou tentar. Mas ai dele se não me fizerdes vê-la !“ e escreveu: “Meu Deus, perdoai os meus erros! “O momento era crítico. Que iria acontecer? Consultamos os guias que disseram: Fizestes bem em pôr toda a confiança em Deus e em nós; tendes a chave para o trazer a vós, ele verá mais tarde aquela a quem ama; nada temais; é uma promessa que deveis aproveitar para o trazer ao bem. Depois desta cena Joseph, esgotado como um lutador, extenuado de fadiga, se ressente da terrível possessão de seu inimigo invisível. Então, operando enérgicos passes magnéticos o Sr. B... acabou acalmando-o completamente. Deus queira que esta cura seja tão brilhante quanto a precedente.
Eis a que se aplicam esses caros irmãos. Que energia, que convicção, que coragem não são precisas para fazer semelhantes curas! A fé, a esperança e, sobretudo, a caridade, e só elas, podem vencer tão grandes obstáculos e afrontar tão temerariamente um grupo de tão temíveis adversários. Eu saí fatigado!
Alguns dias depois assisto em Carcassona a emoções de um outro gênero. Visitava o Sr. presidente Jaubert. Temos numerosos transportes desde algum tempo, disse-me ele. Vou levar-vos à senhorita que é objeto de tais manifestações. Como se de propósito, a senhorita estava indisposta. O estômago estava enfartado, a ponto de não poder abotoar o vestido. Consultados os guias, a sessão foi adiada para o dia seguinte, às oito da noite. O Sr. C..., capitão reformado, pôs seu salão à nossa disposição. É uma grande peça despida, apenas atapetada. Como todo ornamento, apenas um espelho sobre a chaminé, uma cômoda e cadeiras; nem quadros, nem cortinas, nem panos: um verdadeiro apartamento de rapaz. Éramos ao todo nove pessoas, todos adeptos convictos.
Assim que entramos uma chuva de drágeas caiu com ruído num canto da sala! Seria difícil dizer-vos minha emoção, porque aqui a honorabilidade dos assistentes, esta sala nua e escolhida, dir-se-ia tudo de propósito pelos Espíritos, para tirar quaisquer dúvidas, nada que pudesse fazer suspeitar de uma manobra fraudulenta. E, mau grado esse prodígio, eu não cessava de olhar, de examinar as paredes com o olhar e lhes perguntar se não eram cúmplices de um arranjo qualquer.
A senhorita médium tomou seu lápis e escreveu: “Dize a Delanne que ponha a mão no vazio de teu estômago e essa inflamação desaparecerá. Orai antes.” Eis-nos todos em prece. Eu estava na extremidade da sala quando, em meio ao recolhimento geral, uma nova chuva de bombons se produziu no canto oposto aquele de onde tinha partido à primeira vez. Julgai de nossa alegria. Aproximei-me da doente; a inchação era muito maior que na véspera. Impus a mão e a inchação desapareceu como que por encanto. Estou curada disse ela. Seu vestido, muito mais estreito, tornou-se muito largo. Todos constataram o fato. Unimo-nos por pensamento para agradecer aos bons Espíritos tanta bondade. Então houve um terceiro derrame de drágeas. Em minha vida não esquecerei estes fatos. Aqueles senhores estavam encantados, antes por mim do que por eles, habituados a essas espécies de manifestações. Cada um deles possui alguns objetos trazidos pelos Espíritos. Afirmou-me o Sr. Jaubert ter visto várias vezes sua mesa se virar e erguer-se sem auxílio de mãos; seu chapéu levado de um a outro canto da sala. Um fato análogo de cura instantânea também se produziu há alguns meses, sob a mão do Sr. Jaubert.
A senhorita médium, que é, também, sonâmbula muito lúcida, estava adormecida. Então eu lhe disse: “Quer acompanhar-me a Paris? — Sim. — Peço-vos a bondade de ir à minha casa. — Vejo vossa senhora, disse ela; ela me agrada; está deitada e lê.” Descreveu o apartamento com perfeita exatidão. Eis a conversa que teve com minha mulher: “Senhora, não sabeis que o vosso marido está conosco? — Não, mas dizei a meu marido que me escreva. — Vede! eu não tinha visto vosso filho. Ele é gentil. Vossa esposa me diz que tem outro filho, também muito gentil. —Pedi-lhe que vos diga sua idade, — Tem nove meses. — Está bem certo.”
Como sabia que não havia reunião em vossa casa, pedi-lhe que vos fosse ver. Ela não ousava entrar, tanta gente havia e grandes Espíritos. Ela vos detalhou muito bem, caro presidente, bem como vários de nossos colegas.
OBSERVAÇÃO: Rendamos, de inicio, um justo tributo de elogios aos nossos irmãos de Barcelona, por seu zelo e devotamento. Como diz o Sr. Delanne, para realizar tais coisas são necessárias coragem e perseverança que só a fé e a caridade podem dar. Que aqui recebam o testemunho da fraterna simpatia da Sociedade de Paris.
Os fatos de Carcassona farão os incrédulos sorrir e estes não deixarão de dizer que é uma comédia; do contrário, diriam que seriam milagres, mas que o tempo dos milagres já passou. A isto responde-se-lhes que não há nisto o menor milagre, mas simples fenômenos naturais, cuja teoria compreenderão quando quiserem dar-se ao trabalho de os estudar. Por isso não nos damos ao de lhos explicar. Quanto à comédia, seria preciso saber em beneficio de quem foi representada. Certamente a prestidigitação pode operar coisas tão surpreendentes, até mesmo a cura de uma inchação simulada por uma bexiga cheia. Mas, ainda uma vez, em proveito de quem? Sempre se é forte quando se pode opor a uma acusação de charlatanismo o mais absoluto desinteresse; já não seria o mesmo se estivesse em jogo a mais leve suspeita de interesse material. E depois, quem representaria essa comédia? Uma jovem de boa família, que não entra no espetáculo, que nem dá sessões em casa, nem na cidade e não procura fazer falar de si, o que não é negócio dos charlatões; um Vice-Presidente do Tribunal; honrados negociantes; oficiais recomendáveis e recebidos na melhor sociedade. Tal suspeita pode atingi-los? Dirão que é no interesse da doutrina e para fazer adeptos. Mas não seria um meio singular assentar uma doutrina sobre charlatanice, por meio de gente honesta. Mas os nossos contraditores não olham isto de perto, em matéria de contradições; a lógica é a menor de suas preocupações.
Há entretanto, uma importante observação a fazer. Quem assistia à sessão, da qual dá conta o Sr. Delanne? Havia incrédulos a quem se queria convencer? Não, nenhum. Todos eram adeptos que já tinham testemunhado esses fatos várias vezes. Então teriam feito a escamoteação pelo prazer de se enganar a si mesmos. Por mais que digais, senhores, os Espíritos nisto entram de tantas maneiras diversas, para atestar sua presença que, em definitiva, os que riem não estarão do nosso lado. Podeis julgá-lo pelo número sempre crescente de seus partidários. Se tivésseis encontrado um só argumento sério, não teríeis esquecido; mas caís precisamente sobre os charlatões e os exploradores, que o Espiritismo desacredita e com os quais declara nada ter de comum. Nisto nos secundais, em vez de prejudicar. Assinalai a fraude onde quer que a encontreis; não pedimos mais. Nunca nos vistes tomar-lhes a defesa, nem sustentar os que, por sua falta, caíram nas mãos da justiça ou se puseram em contravenção com a lei. Todo Espírita sincero, que se fecha nos limites dos deveres que lhe traça a doutrina, concilia a consideração e o respeito e nada tem a temer.