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Revista Espírita 1863 » Julho » Quadro mediúnico na exposição de Constantinopla

O presidente da Sociedade Espírita de Constantinopla, membro honorário da Sociedade Espírita de Paris, escreve-nos o que segue, em data de 22 de maio último:

 

“Caro senhor Allan Kardec e irmão espírita,

“Há muito tempo me proponho dar-vos notícias minhas, mas não creiais que por isso haja descanso na propaganda espírita. Ao contrário, há mais atividade do que nunca. Crede que neste país inteiramente fanatizado e arregimentado nas seitas, por toda parte o Espiritismo encontra obstáculos que talvez não existam em parte alguma, mas suas raízes são tão vivazes e tão produtivas que, malgrado tudo, penetram pouco a pouco e acabarão por lançar brotos vigorosos, que nenhum poder humano poderá destruir.

“Constantinopla já conta com numerosos adeptos do Espiritismo e, posso afirmar, nas classes mais elevadas da Sociedade. Apenas notei que cada um se fecha em si, por medo de se comprometer.

“Permiti-me citar um fato que aqui se passa, e que denota até que ponto o Espiritismo se inculca: é que vários livreiros que importaram livros espíritas, notadamente o Livro dos Espíritos e o Livro dos Médiuns, os vendem imediatamente, e a quem? Nós, espíritas conhecidos e confessos aos olhos de todos, o ignoramos. Temos certeza do fato, para o qual chamo a vossa atenção, porque, quando alguns dentre nós quer comprar vossas obras, o livreiro responde: ‘Eu as recebi e as vendi imediatamente.’ Nós nos perguntamos quem monopoliza essas obras, assim que são desembaladas, a ponto tal que os nossos, quando as querem comprar, não as encontram.........

 

“Eis agora outra notícia que certamente não vos interessará menos:

“Nosso amigo e irmão espírita Paul Lombardo, médium desenhista, do qual vos mandei algumas flores, executou uma pintura em aquarela representando um belo buquê de flores, entre as quais os amadores destacam uma dália-papoula aveludada de um efeito magnífico; todas as outras flores, como rosas, cravos, tulipas, lírios, camélias, margaridas, dormideiras, escovinhas, amores-perfeitos, etc., são de uma finura e naturalidade perfeitas.

“Levei-o a apresentar o quadro à Exposição Nacional Otomana, agora aberta, e o quadro foi ali admitido com esta inscrição:

 

DESENHO MEDIÚNICO

Executado pelo Sr. Paul Lombardo, de Constantinopla, que desconhece as artes do desenho e da pintura

 

“A esta hora o quadro figura de maneira notável no Palácio da Exposição, à direita do lugar reservado aos quadros e gravuras. O preço foi fixado em 20 libras turcas ou 460 francos. Notai tratar-se de um fato que milhares de pessoas podem constatar autenticamente.

“Recebo cartas de vários pontos da Europa, da Ásia e da África, mas sou sóbrio de respostas, a não ser para encorajar o estudo sério e profundo de nossa grande e bela ciência. Depois eu os remeto sempre às vossas excelentes obras, os livros dos Espíritos e o dos médiuns.

“Temos sempre reuniões para as experiências físicas e para estudos psicológicos. Posto as primeiras quase sempre nos fatiguem, não podemos abandoná-las completamente, pois servem para convencer certos incrédulos, que querem ver e tocar.

“Peço apresenteis à Sociedade Espírita de Paris os respeitosos e fraternos cumprimentos dos nossos irmãos espíritas de Constantinopla e, em particular, deste que também se diz vosso mui devotado irmão,

“REPOS FILHO

Advogado

 

O fato significativo da exposição do quadro do Sr. Lombardo em Constantinopla, posto que admitido, apresentado ostensivamente como produto mediúnico, é a réplica das fábulas espíritas, coroadas nos Jogos Florais de Toulouse.

Foi dito alhures que se a Academia de Toulouse tivesse conhecido a origem dessas fábulas, tê-las-ia repelido. É fazer-lhe a mais grosseira injúria; é, além disso, esquecer que os assuntos enviados a essa espécie de concursos não devem levar assinatura nem qualquer sinal que pudesse revelar o autor, sob pena de exclusão. O Sr. Jaubert não podia, assim, apor nem a sua nem a de um Espírito, nem mesmo dizer que procediam de um Espírito, pois teria violado a lei do concurso, que exige o mais absoluto segredo. É a resposta aos que acusam o Sr. Jaubert de haver usado uma trapaça guardando silêncio sobre a proveniência das fábulas. Seja como for, nos dois extremos da Europa uma sanção oficial é dada a produções de além-túmulo.

Semelhantes fatos bastariam para demonstrar a força irresistível do Espiritismo se, aliás, ela se não tivesse tornado evidente por tudo quanto se passa aos nossos olhos, de alguns anos para cá, e pela inutilidade dos esforços feitos para combatê-lo. E por que são inúteis tais esforços? Porque, como temos dito, ele tem um caráter que o distingue de todas as doutrinas filosóficas, o de não ter um foco único e de não depender da vida de nenhum homem. Seu foco está por toda parte, na terra e no espaço, e se o prejudicam aqui, ele surge ali. Como diz a Sociedade Espírita de Palermo, ele se afirma pelos fatos, que cada um pode experimentar, e por uma teoria que tem suas raízes no senso íntimo de cada um. Para abafá-lo, não se teria que comprimir um ponto do globo, uma aldeia, uma cidade, nem mesmo um país, mas o globo inteiro. Ainda assim, seria uma parada momentânea, pois a geração que surge trás em si a intuição das ideias novas que, mais cedo ou mais tarde, fará prevalecer. Vede o que se passa num país vizinho, onde põem sobre essas ideias uma tampa de chumbo e de onde, entretanto, elas escapam por todas as fissuras.

 


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