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Revista Espírita 1859 » Outubro » Sra. E. de Girardin, médium

Extraímos o artigo seguinte da crônica do Paris-Journal n.º 44. Não há necessidade de comentários. Ele mostra que se os partidários do Espiritismo são loucos, como o dizem pouco delicadamente as pessoas que se arrogam sem cerimônia o privilégio do bom-senso, podemos consolar-nos e até mesmo sentir-nos honrados de ir para os hospícios em companhia de inteligências da têmpera da Sra. de Girardin e de tantos outros.

 

“Outro dia eu vos prometi a história da Sra. de Girardin e de um célebre doutor. Contá-la-ei hoje, porque obtive permissão para fazê-lo. É uma história muito curiosa. Ficaremos ainda no sobrenatural, com o qual nos ocupamos mais do que nunca, nós que, por dever, tomamos o pulso de Paris e sentimos que ele está um tanto febril. Decididamente, para a imaginação humana há uma certa necessidade de saber o futuro e penetrar os mistérios da Natureza. Quando se veem inteligências como a de Delphine Gay entregar-se a essas práticas que consideramos pueris, não lhes podemos recusar uma certa importância, sobretudo quando apoiadas em testemunhos irrefutáveis, tais como este de que vos falo e que ireis conhecer. Refiro-me ao testemunho, mas não ao doutor ─ notai bem.

“A Sra. de Girardin tinha uma pequena prancheta e um lápis. Consultava-os incessantemente. Obtinha, assim, conversas com muitas celebridades da História, sem contar o diabo, que nelas também se metia. Certa noite, ele veio revelar-se a uma importante pessoa que não teve medo, pois que seu papel é o de expulsá-lo. Nada fazia a grande Delphine sem consultar a prancheta. Pedia-lhe conselhos literários, que esta não lhe recusava. Para a ilustre poetisa, era até mesmo de uma severidade magistral. Assim, incessantemente reiterava-lhe o pedido para que não escrevesse mais tragédias sem nenhuma consideração pelos versos maravilhosos de sua peça Judith e Cleópatra. Quem é que vai assistir à representação de uma tragédia? Os fanáticos da poesia dramática. Que buscam eles numa tragédia? Os belos versos que os comovem e emocionam, e Judith e Cleópatra fervilha desses pensamentos de mulher, expressos por uma mulher de um espírito e de um coração eminentes, cujo talento ninguém contesta. Numa palavra, a prancheta não queria mais tragédias; obstinava-se na prosa e na comédia; colaborava nos desenlaces e corrigia a prolixidade.

“Delphine não só lhe confiava seus trabalhos literários, como ainda lhe contava os sofrimentos e pedia orientações para a sua saúde. Ah! essas orientações, ditadas pela imaginação da doente ou pelo demônio, contribuíram para afastá-la de nós. Ela tomava remédios incríveis como fatias de pão com manteiga e pimenta, pimentões e todas as invencionices prejudiciais a uma natureza inflamável como a sua. Disto foram encontradas provas depois de sua morte, da qual os seus amigos e admiradores jamais se consolarão.

“Todo mundo conhece Chasseriau, arrebatado também na flor da idade. De memória, fez um soberbo retrato da bela defunta. Fizeram dele uma gravura, que hoje está em toda parte. Ele levou o retrato ao doutor em questão e lhe perguntou se estava contente. Este último fez alguns ligeiros reparos. O pintor ia consentir nessas modificações, quando os dois tiveram a ideia de se dirigir ao próprio modelo. Colocaram as mãos sobre a prancheta e assim a Sra. de Girardin revelou-se quase que imediatamente. Compreende-se qual teria sido a emoção deles. Interrogada sobre o retrato, disse que não estava perfeito, mas que não deviam retocá-lo, pois se arriscariam a estragá-lo, sendo a semelhança muito difícil de captar, quando não se tem outro guia além da memória. Fizeram-lhe outras perguntas. Recusou-se a responder a algumas delas, mas atendeu a outras.

“Perguntaram o lugar onde se encontrava.

“─ Não quero dizê-lo, retrucou.

“Apesar de todos os pedidos nada puderam obter a esse respeito.

“─ Sois feliz?

“─ Não.

“─ Por quê?

“─ Porque não posso mais ser útil àqueles a quem amo.

“Ficou obstinadamente muda enquanto lhe falaram da outra vida e não deu nenhuma explicação. Também não disse se assim procedia por lhe ser proibido ou se por vontade própria. Depois de uma longa conversa, foi-se embora. Lavrou-se a ata dessa sessão. As duas testemunhas ficaram tão impressionadas que não trataram mais do caso. O doutor podia agora evocar aquele que o ajudava naquele dia, e ter esses dois grandes Espíritos na sua prancheta. Como tudo passa neste mundo! E que ensinamento nestes fatos estranhos, se os considerarmos do ponto de vista filosófico e religioso!”

 


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